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Quando Gregor Mendel iniciou as suas investigações sobre a genética das plantas em 1800, ele trabalhou sozinho um monge Europeu de meia-idade contando ervilhas no jardim da abadia. Cento e cinquenta anos depois, laboratórios modernos de genética de plantas, como Chelsea Specht (ver em baixo), são muito mais diversificados e usam as mais recentes técnicas de sequenciamento de ADN. Quando J.J. Thomson descobriu uma nova partícula o eletrão ao virar do século XIX para o XX, o seu equipamento de laboratório consistiu principalmente em tubos de vácuo, imanes, e algumas ligações simples. Cem anos depois, os cientistas procuram novas partículas como o bosão de Higgs com um enorme acelerador de partículas uma máquina com 27 km, que custa vários milhares de milhão de euros e produzirá dados que serão analisados pelo supercomputador mais poderoso do mundo. A ciência já percorreu um longo caminho nos últimos 150 anos! Temos agora técnicas mais poderosas de análise de dados, equipamentos mais sofisticados para fazer observações e realizar experiências, e uma amplitude e profundidade do conhecimento científico muito maiores. E, como as atitudes da sociedade em geral têm progredido, a ciência tem beneficiado da expansão da diversidade de perspetivas oferecida pelos seus participantes. Mas o que acontece com o processo da própria ciência? Será que este aspeto fundamental do empreendimento científico mudou ao longo do tempo?
Desde as experiências de Gregor Mendel com ervilhas ao trabalho em evolução das plantas num laboratório moderno, e do equipamento primitivo de JJ Thomson até ao LHC (Large Hadron Collider, no CERN) a ciência, de facto, já percorreu um longo caminho. |
A ciência irá sempre procurar explicações para o que acontece no mundo natural e testar essas explicações através da evidência do mundo natural mas exatamente como isso é feito pode evoluir. O empreendimento científico não é estático. A ciência está profundamente interligada com a sociedade, e tal como a sociedade muda, também a ciência muda. Aqui estão apenas alguns exemplos de como as práticas científicas modernas foram transformadas pelo aumento do conhecimento, pelas mudanças nas preocupações da sociedade, e pelos avanços na comunicação e tecnologia.
Publicação e revisão por pares
O surgimento da internet tem permitido que os resultados científicos sejam divulgados mais depressa que nunca. Artigos de revistas científicas são muitas vezes disponibilizados online, mesmo antes de serem impressos. Esta distribuição rápida de informação pode acelerar o ritmo da ciência, porque os estudos mais recentes podem ser escrutinados, replicados, e/ou desenvolvidos com muito pouco tempo de atraso. E à medida que mais e mais revistas mostram comentários dos leitores nos artigos publicados online, o processo de revisão por pares está a ser alargado: muito mais cientistas podem fornecer feedback sobre um determinado artigo, e podem fazê-lo muito após a publicação original do artigo. Mas o fluxo de informação não para aí. Jornalistas também podem aceder rapidamente às últimas descobertas científicas e divulgá-las à população em geral. Informação científica sobre uma ampla variedade de temas já está disponível a qualquer pessoa com uma ligação à internet o que facilita manter-se informado, mas também traz responsabilidades. Os consumidores desta informação devem lembrar-se que, na ciência, o primeiro relato de uma descoberta nunca é a palavra final. Muitos anos e diversas séries de testes podem ser necessários antes que a ciência tenha certezas sobre a conclusão. Com tanta informação, vinda de tantas fontes diferentes, é hoje em dia mais importante do que nunca ser-se um consumidor crítico das mensagens sobre a ciência transmitidas pelos meios de comunicação social.
Os avanços tecnológicos também acrescentaram um passo adicional à revisão de muitos artigos científicos: análise de imagem. Em 2004, Woo Suk Hwang anunciou à comunidade científica e ao resto do mundo que tinha alcançado um marco da biologia - a clonagem de células estaminais embrionárias humanas. Nos dois anos que se seguiram, em parte através do exame minucioso de imagens dos seus artigos publicados que pareciam ser duplicadas e manipuladas, este "avanço" foi exposto como sendo uma fraude. Depois de casos como o de Huang virem à luz, muitas revistas começaram a examinar mais cuidadosamente as imagens em artigos científicos, muitas vezes usando programas de computador para analisar digitalmente fotos, procurando manipulações.
Especialização e colaboração
À medida que o nosso conhecimento científico avança e que as questões que procuramos responder se tornaram mais complexas, a ciência tornou-se mais especializada. Enquanto que as pesquisas de Charles Darwin em 1800 parecem não ter tido limites ele estudou a teoria da evolução, a geologia, as emoções humanas, a ecologia do solo, os corais tropicais, lesmas e botânica um cientista moderno provavelmente irá focar-se sobre um tema mais restrito: por exemplo o desenvolvimento da salamandra, ou mudanças climáticas antigas em ecossistemas aquáticos. Não é que os interesses dos cientistas modernos sejam menos amplos, mas o nosso conhecimento expandiu-se de tal forma que obter a perícia (e os recursos) necessária para fazer investigação de ponta num campo pode representar um enorme investimento de tempo e esforço. Por esta razão, os cientistas modernos tendem a ser mais especializados do que os seus antecessores.
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Em 1800, os cientistas e naturalistas tinham interesses amplos, o que se reflete nesta vista do gabinete de Darwin (à esquerda). O laboratório de biologia molecular moderno ilustra a tendência atual em direção à especialização. |
Esta especialização (juntamente com a complexidade das questões que a ciência moderna investiga) exige mais colaboração interdisciplinar do que no passado. Por exemplo, um projeto recente investigando a desertificação no sul da Europa, envolveu a colaboração entre sociólogos, antropólogos, arqueólogos, engenheiros agrónomos, biólogos e matemáticos.1 Além disso, os cientistas hoje em dia já estão mais propensos a trabalhar em equipas grandes independentemente da sua especialização disciplinar. Em 1960, o número médio de autores de artigos científicos e de engenharia foi de cerca de 1,9. Em 2000, esse número chegou a 3,5 e estava a subir.2 Os exemplos mais extremos de trabalho científico moderna em equipa são verdadeiramente surpreendentes. O artigo que apresenta a sequência inicial do genoma humano teve mais de mil autores,3 e um número semelhante de físicos está envolvido com o Large Hadron Collider, um projeto recente na física de partículas. Felizmente, os avanços na comunicação, especialmente a internet, têm suavizado esta transição para a ciência em equipa. Ideias, planos e dados podem ser facilmente compartilhados, independentemente da distância ou de fronteiras políticas e institucionais. Na realidade, muitos dos maiores projetos disponibilizam os seus dados brutos através da internet para que todos os possam escrutinar ou usar na sua investigação.
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Veja você mesmo os dados. Visite o website di Projeto do Genoma Human para um tutorial sobre como aceder livremente a dados de genética online.
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Pierre e Marie Curie trabalharam com radiação durante muitos anos, numa altura em que ninguém conhecia os seus efeitos nefastos
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Regulação
Nos anos 1830, durante uma viagem a bordo do Beagle, Charles Darwin acumulou uma vasta coleção de espécimes de animais e plantas de todo o mundo para os seus estudos científicos. Na década de 1880, Louis Pasteur testou uma vacina, expondo grupos de ovelhas vacinadas e não vacinadas à bactéria antraz. Na década de 1890, os estudos de radiação de Marie e Pierre Curie foram realizados sem quaisquer precauções ambientais ou de segurança e, de facto, as suas notas de pesquisa desses anos ainda são tão radioativas que quem quiser estudá-las tem que assinar um termo de risco! Hoje, cada um destes estudos seria objeto de regulamentação significativa por parte de agências governamentais e instituições científicas mas, historicamente, tem havido relativamente poucas diretrizes e regras sobre ética, segurança e impacto ambiental da investigação científica. Como a sociedade e a comunidade científica se preocupam cada vez mais com esses aspetos, organizações científicas e governamentais criaram diretrizes para minimizar os impactos potencialmente negativos e para garantir que a investigação é realizada de forma ética.
O processo da ciência evolui claramente a par dos avanços no conhecimento e na tecnologia, e com as preocupações da sociedade. A internet abriu novas formas de os cientistas compartilharem informações e trabalharem conjuntamente em projetos. A expansão do nosso conhecimento tem influenciado até que ponto os cientistas se especializam em subdisciplinas e, consequentemente, o quanto eles colaboram. E, claro, já que tanto a comunidade científica e a sociedade em que está inserida se tornaram cada vez mais preocupadas com a segurança, proteção ambiental, e o tratamento dos participantes em estudos em animais e humanos, novos limites foram colocados na forma como a investigação é realizada. Estas mudanças não sugerem quaisquer alterações fundamentais na forma como a ciência funciona continua a ser encontrar explicações para os fenómenos do mundo natural consistentes com múltiplas linhas de evidência e que resistem ao escrutínio da comunidade científica mas realçam a flexibilidade do processo da ciência ao acomodar novas preocupações e aproveitar novas oportunidades. |
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